quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Mestres

Mestres
A primeira casa foi na Rua da Torrinha, era uma casa pequena de um só piso com bananeiras à volta.
Depois o meu pai mudou-se para a Rua da Carne Azeda, era a casa da minha bisavó, mãe do meu pai, que ficou a viver connosco. Também era uma casa pequena, mas que o meu pai pode fazer obras à medida que ia amealhando algum dinheiro. A casa inicialmente tinha 2 quartos, cozinha e casa de banho, depois foi aumentando e subindo mais uma andar, hoje é uma casa grande, com um quintal que até já teve laranjeiras, limoeiros, galinhas e passarinhos e sempre muitas flores, vasos de flores e canteiros.
O meu pai sempre teve muito cuidado com a casa, sempre tentou preservá-la, mas para isso era necessário ter mestres de vez em quando.
E os mestres eram a dor cabeça da minha mãe, ora era pintar por fora, ora por dentro, outra vez eram os patassóis, depois o chão, que era daquela pedra de calhau, no quintal o meu pai ainda inventava arranjos na parte das flores, canteiros, etc, etc.
Tudo isto implicava com uma série de coisas que a minha mãe não gostava, gente estranha a invadir-lhe a casa e a deixar tudo numa imundície.
Foram tantos os mestres que por aquela casa passaram. Havia um que era um bonito homem, alto de cabelo preto, muito liso, educado, e envergonhado. Era um mestre especial, o mais limpo de todos, quando terminava o seu trabalho, varria tudo com muito cuidado, limpava o pó do cimento e retirava todas as impurezas. Era muito atencioso e ficava corado só de lhe dirigirem a palavra. Mais tarde e numa fase já muito mais próxima dos dias de hoje apareceram os últimos dois. O primeiro foi um grande amigo do meu pai, e por amizade com o meu pai, fez algumas obras, quando comprei a minha casa em 2004 e quando uma das minhas irmãs restaurou a casa. Era um mestre muito evoluído, com pinta de engenheiro ou de arquitecto, com uns lindos olhos azuis e cabelo branco. Foi uma pessoa crucial na restauração e renovação da casa que decidimos comprar. Às vezes não sei se o meu pai tinha mais orgulho nele ou na filha que tinha adquirido a casa, eram mesmo amigos.
A minha mãe aborrecia-se com tudo o que era obras, concertos, restauros, sujavam-lhe a casa, para ela não eram necessárias tantas pinturas, na sala, na corredora, nos quartos, na cozinha, na mesa, nos armários e nas bancas, e ainda nas portas, quando o meu pai se lembrava. O cheiro a tinta que a intoxicava, a caliça, o cimento, os trapos, as latas as trinchas que os mestres deixavam por lá esquecidas. Tudo isto lhe fazia confusão. Recordo os móveis estarem todos afastados da parede, cobertos com lençóis velhos e diários a cobrir o chão. Confesso que não era um quadro bonito de se ver, mas como dizia o meu pai, tinha de ser.
Como se não bastasse o meu pai assim ser, eu tinha uma irmã que também gostava de obras e de mudanças. Um dia, e porque era moda, forrou o nosso quarto com papel de parede, pintou as camas, guarda-fato, armários, cómoda, cadeira com tinta cor de casca de ovo, fez colchas e cortinas novas, tudo porque queria ficar com um quarto diferente, novo e moderno. Sei que houve uma discussão muito grande com o meu pai, mas depois ele acabou por aceitar.
Ainda hoje é um desatino quando ela se lembra de forrar as almofadas da sala com tecido diferente ou fazer umas colchas e umas cortinas novas para o quarto dos meus pais.
12.02.15


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